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Garotices - Conto



Aquele lugar era conhecido como canto negro. Ninguém sabia dizer quem o havia apelidado assim ou porquê e todo mundo evitava falar a respeito. O local nada mais é que um grande e único cômodo sem iluminação no qual lésbicas exploravam as suas sexualidades literalmente às cegas.
Era um lugar frequentadíssimo e muito conhecido por revelar muita gente que nem sabia onde estava se metendo.  Em frente ao canto existe um bar, que é onde me encontro agora. Estou há algumas horas dividida entre encarar uns bons drinques ou encarar uma entrada no canto negro. Estou decidida a não findar o dia sem quebrar um desses dois tabus, no mínimo. Se sou lésbica? Acredito que sim. Sei que sou. Mas me falta falta de vergonha na cara e é isso que pretendo perder hoje no canto. Respiro fundo e atravesso a rua. Primeiro passo dado, sem pânico. Quando ultrapasso a primeira porta eu sinto minha cabeça girar. O escuro chega a doer os olhos, que ficam gritando atrás de um ponto de luz, algo a que se prender. Seguro a maçaneta da segunda porta, única coisa que agora me separa do incerto. Respiro fundo mais uma vez e me lanço de escuridão pra escuridão, me sentindo uma virgem diante dos olhos de cafetões. O pior, no caso, era não saber para onde ir. Ou quem estava ali. Conversas eram proibidas ali dentro e eu conseguia ouvir estalos e gemidos abafados. Será que essas pessoas ouviam umas às outras? Possivelmente não. Caminho devagar, passos pequenos. Meu maior desejo é apenas não tropeçar e cair. Não esbarrar em ninguém. Meu coração batia tão alto que eu tinha a impressão de que todos ali podiam ouvi-lo e isso me aterrorizava cada vez mais. Quase arfando, eu subitamente paro ao ouvir um respirar rente ao meu ouvido. Congelo. Que fazer... Que fazer... Me viro devagar e paro de frente a fonte. Uma completa estranha. Minha mente brilhante resolver respirar fundo em resposta, demonstrando a minha presença. Meio segundo depois um par de mãos me tomou pela cintura e juntou nossos corpos. A respiração de novo rente ao ouvido, meu coração de novo incomodando a população inteira de lésbicas num raio de dois quilômetros, no mínimo. Os lábios percorreram o caminho até os meus devagar... Como se tivéssemos todo o tempo do mundo. Talvez fosse só o meu drama de primeira vez, ou a respiração ofegante tenha ouvido meu coração latejar, mas algum esforço parecia existir em não fazer nada de errado e parecia vir de ambos os lados. Durante um beijo lento -naquele escuro propicio para as paixões de uma noite-, o par de mãos seguiu rumo aos meus seios, demorou-se no meu pescoço e findou enrolando de leve uma mecha do meu cabelo. Pude sentir um sorriso em meio ao beijo, como se a respiração ofegante soubesse agora exatamente com quem está lidando. Será que...? Não. Não era possível. O par de mãos tomou minhas mãos e me lembrou que não se deve ser estátua durante um beijo. Pousei-as na cintura da respiração ofegante. Será que...? Mexendo um pouco as mãos pra trás e... Cabelo grande. Bem grande. Será? Meu coração batia mais alto que som de balada. Quais as chances? Outro sorriso entre o beijo. Mas que porra. Justo ela? Eu não estava aqui justamente pra que ela não fosse minha primeira e eu acabasse fazendo merda? A respiração agora nomeada fez um sinal de silencio contra meus lábios, como se soubesse do turbilhão que me inundava. Como silêncio? Talvez se... Ok. Desabotoando a minha calça. Talvez eu devesse mesmo ter vindo de vestido, era menos trabalho. Talvez eu não tivesse vindo com essas intenções. Mas ela... Intenções não importavam. Nada importava. Estava escuro e ainda sim eu, agora, podia sentir seu olhar pesando sobre mim e mesmo no silencio tua voz ainda dizia que meu olhar inseguro a enchia de tesão. E que tesão. Meu coração palpitava e agora tudo em mim palpitava junto, palpitava tu e aquele lugar inteiro. Agora eu tinha a confirmação de que não, ninguém escutava nada ao redor. E a vontade de gritar somada a impossibilidade de o fazer tornava toda e qualquer coisa mais intensa. Se ela queria provar pra mim alguma coisa, acabou me fazendo provar várias porque não demorou muito estava eu de joelhos, depois ela e tantos toques que eu talvez tenha perdido a conta de quantas noites perdi lá dentro - embora, na realidade, não foram nem três ou quatro horas. Ficamos depois as duas ainda um bom tempo simplesmente paradas, a respiração ofegante desesperada atrás de calma (eu já desistira de fazer o coração parar de gritar). Ela desliza um papel pra dentro do meu bolso e dá um beijo estalado em meu ouvido. Meu mundo gira da dor súbita e da sensação de ser largada sozinha sem saber para onde caminhar - novamente uma virgem diante do abutre. E, dessa vez, uma virgem que já não busca assédio. Saio correndo em direção a lugar algum, e, depois de interromper no mínimo dois orais e três beijos, encontro a saída -  bem a tempo de ver aqueles cabelos esvoaçantes virando a esquina. Corro pro bar.  "Moço, me vê qualquer coisa que inebrie e intensifique sensações. Mas não demais... Só o suficiente pra essa alegria não virar a esquina e ir embora". O barman, acostumado com loucuras, nem questiona nada. Nem depois, ao me ver sorrindo boba pra um pedaço besta de papel... Só encha ai o copo e mantenha acesso o fogo.  

N.M.,"Tenho guardado esse bilhete pro dia que você ousasse e desse certo. Pro dia que aprendesse que você tem tudo, só te faltava coragem"

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